O setor de música digital hoje é bem diferente do cenário de vinte anos atrás. Na década de 2000, a compra legalizada de álbuns digitais era bastante restrita e o CD dominava o formato das mídias físicas. Por outro lado, a pirataria de arquivos no formato MP3 era bastante difundida, muito por causa de programas de busca e download desse tipo de arquivo.
Um exemplo de ferramenta que se popularizou a partir dessa prática é o LimeWire. Esse software nasceu graças a um investidor veterano, conquistou um grande mercado, resistiu o máximo que foi possível contra processos de gravadoras e hoje é lembrado por quem viveu esse período, em que era muito mais demorado e até perigoso baixar arquivos pela internet. Mas você sabia que o LimeWire até chegou a ser reativado? Confira a seguir toda essa história.
A origem e a explosão do LimeWire
O LimeWire é um programa P2P ou peer-to-peer, um software de download e compartilhamento de arquivos em múltiplos formatos. A partir dessa tecnologia, a mesma de vários outros programas da época, usuários podiam acessar uma rede descentralizada com um vasto acervo de músicas, filmes e outros materiais sem custos.
O empreendimento nasce em 2000 graças a Mark Gorton, que anos antes fez carreira como investidor em Wall Street, o coração financeiro dos Estados Unidos. Ele mantinha uma empresa chamada Lime Brokerage, uma corretora baseada em negociações automatizadas e outras tecnologias, tirando dela a inspiração para o nome do programa.
O “mentor” indireto do programa era o Napster, o pioneiro programa de distribuição e download de arquivos no formato MP3. Ele foi também a primeira grande vítima dos processos contra a pirataria de músicas na internet, mas Gorton achava que teria um destino diferente.
No período áureo, os números da ferramenta impressionam:
- o LimeWire teve por volta de 50 milhões de usuários antes de ser desativado;
- a receita do serviço passou de US$ 6 milhões em 2004 para US$ 20 milhões dois anos depois;
- segundo a BigChampagne, em 2007 ele estava instalado em mais de um terço (36,4%) de todos os PCs em uma pesquisa global feita com 1,66 milhão de pessoas;
- já em 2009, uma pesquisa descobriu que o programa era usado por 58% das pessoas que já tinham baixado música de uma rede P2P;
- a fama gerou uma comunidade unida e produtiva, que chegou a lançar uma versão de código aberto do programa chamada FrostWire, sem o mesmo sucesso do original;
Escrito em Java, o LimeWire começa a operar ainda de forma discreta e usando a rede Gnutella, o que tornava os downloads bastante lentos. Quando o agora Lime Group desenvolve uma estrutura própria, o serviço passa a se destacar em meio aos rivais.

Baseado no simples ato de busca e download dos arquivos desejados, o programa tinha uma interface muito intuitiva, mais leve (e seguro) que o Kazaa e mais fácil de usar que o eMule. O LimeWire ainda fez muito dinheiro ao lançar uma versão Pro (com suporte e downloads mais rápidos), além de embutir anúncios ou softwares no instalador da variante grátis.
O fim do LimeWire (e de vários outros rivais)
O LimeWire operou por praticamente uma década, o que é um tempo considerável para programas dessa categoria, que são perseguidos em ações judiciais por grandes conglomerados.
A derrocada do LimeWire, porém, coincide em vários pontos com a derrubada definitiva de outros serviços parecidos que circulavam na mesma época. Os softwares que sobreviveram, como é o caso do eMule, hoje são usados por uma parcela muito menor da comunidade que um dia dependeu dessas plataformas para baixar músicas e filmes.
- Em 26 de outubro de 2010, o LimeWire fechou as portas após uma decisão de um tribunal dos Estados Unidos condenar a companhia por “infração em escala massiva” dos direitos autorais de trabalhos de artistas de vários segmentos;
- O processo foi aberto ainda em 2006 pela Recording Industry Association of América (RIAA), principal representante de gravadoras do país, e levou quatro anos até ser finalizado;
- Na acusação, a RIAA diz que o LimeWire custou “centenas de milhões de dólares em receita” para gravadoras e foi um dos responsáveis pela queda na renda desse setor entre 1999 e 2009;

- Em vez de aceitar um acordo, como foi o caso do Kazaa, o LimeWire retrucou a acusação alegando que a entidade tinha “atividades anticompetitivas” e “práticas comerciais enganatórias” ao tentar restringir as atividades do programa. Essa discordância foi o fator que fez o processo se arrastar por tanto tempo;
- Como alternativa para não fechar as portas, o LimeWire chegou a anunciar a criação de um serviço legalizado de compra de músicas digitais chamado Spoon, mas o plano não foi aceito pelas autoridades e levaria mais de um ano para ser implementado;
- De acordo com as notícias da época, o acordo entre o Lime Group (que já havia passado por demissões recentes) foi de pagar uma indenização de US$ 105 milhões;
Para piorar a situação do programa, a fama dele na nova década já não era mais a mesma. A rede naquele momento estava tomada por malwares disfarçados de arquivos legítimos e compartilhamento de materiais criminosos, incluindo conteúdos de abuso em um problema que também afetava outros programas P2P.
O próprio setor de download de arquivos piratas estava atravessando uma mudança: o torrent também já era visto como uma alternativa mais segura para o compartilhamento sem custos, enquanto as plataformas legalizadas se difundiam. A iTunes Store já era uma alternativa para pagar por música desde 2003, enquanto serviços de streaming de música estavam começando — como o Deezer (2007) e o Spotify (2008).
O LimeWire voltou mesmo?
Em 2022, o mercado de tecnologia foi pego de surpresa: o LimeWire parecia estar de volta. Entretanto, dessa vez ele não tem mais a proposta de fornecer o download de arquivos da internet, além de não ter qualquer envolvimento do criador original: a marca expirou e foi simplesmente retomada por outro empreendimento.
A versão atual do LimeWire é totalmente diferente do serviço que consagrou o programa duas décadas atrás. Ele agora é um serviço de armazenamento e compartilhamento de arquivos, nos moldes de ferramentas como WeTransfer e Dropbox, sem a necessidade de baixar um programa para o PC.

É possível enviar para outras pessoas arquivos de até 4 GB sem precisar criar uma conta, com duração de uma semana para o link. Junto do lançamento, a companhia lançou ainda uma criptomoeda: o token LMWR, que pode ser usado como método de pagamento e recompensa para usuários ativos.
A empresa também vende planos Premium a partir de US$ 9,99 (ou cerca de R$ 55,60) que incluem mais espaço disponível e ferramentas de inteligência artificial (IA) para criar vídeos e imagens. Esse recurso funciona a partir de modelos de linguagem de outras companhias, como OpenAI, Google e Stable Diffusion.
Antes disso, ela tentou abraçar a indústria dos tokens não-fungíveis (NFTs) e até tinha uma proposta ousada de trabalhar ao lado de músicos e gravadoras — justamente quem conseguiu derrubar a versão original desse produto. Essa ideia, junto com quase todo o mercado de NFTs, já foi deixada de lado.
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