Mais cheias, mais secas, mais eventos climáticos extremos. Essa é a previsão para o Rio Grande do Sul até 2100, segundo um novo estudo do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em parceria com a Agência Nacional de Águas (ANA).
A pesquisa traz projeções construídas a partir de dados dos últimos 50 anos e aplicadas a cenários entre 2050 e 2100. Os pesquisadores apontam que o Sul é uma das regiões brasileiras mais sensíveis a mudanças no ciclo hidrológico. E que os impactos já estão a caminho.
Por isso, o estudo recomenda revisão urgente de práticas de engenharia e planejamento. A pesquisa reforça que “os gastos com reconstrução e as perdas associadas a secas e cheias podem superar grandemente os custos de medidas de preparação e prevenção”.
Mudanças climáticas intensificam cheias e secas no Sul, segundo estudo
O levantamento do IPH/UFRGS considera rios e cursos d’água do país, mas foca principalmente no Rio Grande do Sul, onde as mudanças climáticas alteram o regime de chuvas, vazões e estiagens.
A pesquisa mostra que o estado está entrando num século no qual extremos hídricos deixam de ser exceção para se tornar parte da rotina.

As simulações indicam que a precipitação média anual pode aumentar 4,8%, mas o salto mais expressivo está na frequência. Eventos raros, com tempo de retorno de 100 anos, poderão ocorrer até cinco vezes mais frequentemente. Ou seja, o que hoje parece estatisticamente improvável tende a se repetir em intervalos cada vez menores.
Chuvas intensas de curta duração, que duram horas ou um dia, também devem ficar mais volumosas, com aumento de 15% para eventos com retorno de até dez anos. Já as chuvas máximas diárias podem crescer até 60%.
Esse salto altera diretamente o comportamento das cheias. Nos grandes e médios rios do Sul, a vazão máxima pode aumentar 20%, enquanto episódios frequentes devem ter aumento de 14%, e eventos raros, 13%.
O professor Rodrigo Paiva exemplifica que “cheias em rios da Serra poderiam ter níveis três metros mais elevados [do que atualmente]”.
“Em Porto Alegre e região, a cheia poderia alcançar níveis entre 50 centímetros e um metro maiores, o que superaria os sistemas de proteção atuais, com as águas invadindo novamente áreas urbanas, além de regiões não atingidas em maio de 2024”, acrescenta.
Paiva também alerta para a mudança de frequência: “Um evento extremo que atualmente ocorre a cada 50 anos poderá ser registrado, no futuro, a cada dez anos”.
Em contrapartida, o estudo observa o prolongamento da estação seca em parte do território gaúcho. O déficit hídrico projetado é 42% maior, enquanto as vazões mínimas caem 11%, com estiagens se estendendo em média três dias a mais por ano.
Esses períodos críticos impactam principalmente a agricultura e o abastecimento urbano. E devem tornar a gestão da água um desafio permanente para o estado. Afinal, no mesmo ano, pode enfrentar tanto vazões excessivas quanto falta d’água nos reservatórios.
Ou seja: o desafio não é apenas resistir às cheias, mas também garantir segurança hídrica diante das secas projetadas. A pesquisa aponta que os riscos são expressivos mesmo em projeções moderadas e reforça que o futuro já começou a se materializar.
O que a pesquisa recomenda fazer para evitar prejuízos
As conclusões são descritas como “suficientemente convergentes”. E essa convergência de evidências cria um consenso científico incomum, que pressiona governos a agir antes dos custos se tornarem irreversíveis.

Diante dos resultados, os pesquisadores defendem a revisão urgente da prática hidrológica, com incorporação de novos critérios em obras e planos urbanos.
O Rio Grande do Sul, após as cheias de 2023 e 2024, já iniciou uma revisão profunda nos parâmetros de projetos. A ideia é garantir que novas infraestruturas consigam suportar cenários mais severos. Assim, a lógica muda: projetar para o futuro em vez de apenas repetir padrões baseados no passado.
Essa virada exige novos critérios. Projetos passam a superar o pior evento histórico conhecido e devem considerar o aumento previsto na frequência e intensidade.
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Algumas diretrizes já sinalizam o caminho. Entre elas, estão: sistemas de drenagem urbana que devem suportar chuvas de 115 milímetros em um dia e projetos contra cheias que precisam considerar acréscimo de 13% na vazão máxima.
Somam-se medidas de adaptação como sistemas de alerta antecipado, infraestrutura resiliente (como diques e drenagem reforçada), planejamento urbano com mapeamento de risco e gestão integrada dos recursos hídricos. Se vai ser o suficiente para aguentar o que está por vir, só o tempo dirá.
(Essa matéria usou informações do G1 e do Zero Hora.)
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