A discussão sobre “voltar ou não ao escritório” virou quase uma guerra cultural corporativa. O debate está quente, mas está sendo travado da forma errada. A pergunta não deveria ser qual modelo é o melhor, mas melhor para quem, quando e em qual contexto.
Minha opinião pode parecer a de alguém “isento”, mas não é: não existe modelo certo, existe modelo coerente. E coerência, aqui, depende menos da preferência individual e mais das lentes pelas quais cada empresa enxerga seu próprio negócio.
Li recentemente uma frase que sintetiza bem este momento: não existe decisão 100% racional, mas 100% das decisões são racionalizadas. Cada organização constrói uma justificativa que faz sentido para si.
O modelo sempre parece “correto” dentro do racional que a empresa e seus líderes formaram: o estágio do negócio, a dinâmica do setor e dos concorrentes, a maturidade dos times, a cultura já estabelecida, a necessidade de velocidade, o estilo de tomada de decisão da liderança, entre infinitos motivos.
Para quem vê de fora, o mesmo modelo pode parecer totalmente equivocado, mas é porque está sendo julgado com outras lentes (ou lentes parciais). Na prática, as empresas não escolhem home office, presencial ou híbrido por ideologia; escolhem por operação, contexto e sobrevivência. E, nessa dinâmica, nenhum modelo é universal.
Eu mesmo precisei revisar convicções antigas. Antes da pandemia, eu acreditava que uma empresa só respirava cultura com todo mundo junto. Era quase dogma. Até que o remoto virou obrigação e mostrou que muito do que eu chamava de cultura era, na verdade, hábito.
Descobri que as pessoas crescem quando ganham tempo; que reuniões diminuem quando existe clareza; que criatividade não depende de CEP. Mas também vi o lado B: a solidão, a queda nos aprendizados informais, conversas difíceis transformadas em mensagens mal interpretadas.
O remoto pode ser libertador e, ao mesmo tempo, exigir maturidade, comunicação e intencionalidade. Esses são só alguns exemplos das inúmeras nuances que cada modelo impõe aos seus stakeholders.
Então estou dizendo que a resposta é “depende”? Sim, estou. E vejo isso diariamente na Olist. Lidero áreas que vivem contextos completamente diferentes, negócios que estão nascendo do zero, negócios em plena trajetória de crescimento e negócios maduros, com a previsibilidade típica de receita SaaS.
Em paralelo, há operações com dinâmica de volumetria, muito mais sensíveis a velocidade e coordenação. Existem times com culturas já consolidadas e outros em que novas lideranças estão imprimindo sua própria lógica de gestão.
Cada nuance altera a receita do bolo. E é justamente essa combinação de fatores que define a racionalização do que é “melhor” para aquele negócio e para seus stakeholders naquele momento.
Cada empresa está atravessando um momento distinto.
Há organizações contratando e integrando pessoas novas todos os meses, e nesses casos a convivência acelera confiança, reduz ruído e encurta a curva de aprendizagem. Há empresas reduzindo custos fixos e que encontram no remoto a possibilidade de continuar vivas. Outras dependem do contato humano porque o atendimento é o coração do negócio e olhar o cliente nos olhos faz parte da entrega de valor. Não existe um único caminho e tudo bem.
Com o tempo, aprendi que o debate não deveria ser sobre “onde trabalhar”, mas sobre “como trabalhar em cada contexto”. Há momentos em que a presença física acelera decisões, conexão e aprendizado; em outros, a flexibilidade do remoto aumenta foco, autonomia e tração. Já vi exemplos bons e ruins de ambos os modelos.
O que sustenta a performance não é o formato em si, e sim a clareza de prioridades, o nível de alinhamento com a liderança, a qualidade das relações e a confiança construída no dia a dia. O desenho do modelo de trabalho precisa conversar com a fase do negócio e com a operação, e não com uma crença abstrata de que um formato é, por natureza, melhor que o outro.
