Após anos de euforia, a indústria automotiva dos Estados Unidos começa a rever suas apostas em veículos elétricos. A queda na demanda e o fim de incentivos mudaram o jogo.
Montadoras como GM, Ford e Hyundai ajustam planos, cortam investimentos e apostam em híbridos, enquanto especialistas apontam 2026 como um ano decisivo para o futuro do setor.

Da empolgação ao choque de realidade
No início da década de 2020, os veículos elétricos pareciam o caminho inevitável para a indústria automotiva. Bilhões foram investidos, metas ambiciosas anunciadas e o discurso era de uma transformação acelerada. No entanto, a demanda dos consumidores não acompanhou o ritmo esperado. Com vendas abaixo das projeções e fábricas subutilizadas, o setor entrou em uma fase descrita por analistas como “realismo”.
Temos que fazer os investimentos para nos adequarmos ao ambiente regulatório que eles estabeleceram. Vimos uma mudança completa nisso.
Marry Barra, CEO da General Motors, durante a conferência DealBook do The New York Times.
A fala resume o cenário atual, marcado por ajustes rápidos diante de mudanças regulatórias e de mercado.

Investimentos bilionários sob revisão
O impacto financeiro dessa virada é significativo. A GM anunciou um impacto de US$ 1,6 bilhão (cerca de R$ 8 bilhões) relacionado à redução de investimentos em veículos elétricos e já sinalizou novas baixas contábeis. A Ford foi ainda mais longe e informou que espera registrar cerca de US$ 19,5 bilhões (aproximadamente R$ 97 bilhões) em itens especiais ligados à reestruturação de suas prioridades.
Jim Farley, CEO da Ford, deixou claro o novo foco da empresa: “Estamos seguindo os clientes para onde o mercado está, não para onde as pessoas achavam que ele estaria”. Na prática, isso significa ampliar a oferta de híbridos e reduzir apostas exclusivas em modelos 100% elétricos.
Entre os fatores que explicam essa guinada estão:
- queda na demanda após o fim dos incentivos federais.
- custos elevados de produção.
- infraestrutura de recarga ainda limitada.
- preferência do consumidor por híbridos.

O fim dos incentivos e a queda nas vendas
As vendas de veículos elétricos nos EUA atingiram o pico em setembro, representando 10,3% do mercado de veículos novos. Com o fim dos incentivos federais de até US$ 7.500 (cerca de R$ 37,5 mil), essa participação caiu para estimativas de 5,2% no quarto trimestre, segundo a Cox Automotive.
Para Stephanie Valdez Streaty, diretora de insights da indústria da Cox, o futuro continua elétrico, mas com um ritmo diferente. “A direção de longo prazo para a eletrificação permanece clara: o futuro é elétrico. No entanto, o cronograma está sendo recalibrado”, afirmou.
A PwC reforça essa leitura mais cautelosa. A consultoria projeta que os veículos elétricos representem 19% do mercado automotivo dos EUA até 2030 — um avanço relevante, mas insuficiente para sustentar, no curto prazo, os investimentos bilionários feitos até agora. Por isso, a estratégia das montadoras passa por um “mosaico de sistemas de propulsão”, combinando elétricos, híbridos e motores a combustão.
O efeito Tesla e as lições do mercado
Grande parte da empolgação inicial veio do sucesso da Tesla, que dominou o mercado e se consolidou como líder em vendas. No entanto, especialistas observam que muitos consumidores estavam comprando a marca Tesla, e não necessariamente a ideia do veículo elétrico em si.
Leia mais:
- Robotáxis ficam sem saber o que fazer no meio da rua durante apagão
- Rivian amplia direção semiautônoma com atualização de software
- Carros elétricos podem abastecer casas e reduzir a conta de luz
“A Tesla não estava criando um mercado de veículos elétricos a bateria. Ela criou um mercado para a marca Tesla”, disse Stephanie Brinley, da S&P Global Mobility.
Com o fim dos incentivos e mudanças políticas recentes, o setor agora busca equilíbrio. Como resumiu Jeremy Robb, da Cox Automotive, “o próximo ano será crucial para os veículos elétricos”.
O post O choque de realidade dos veículos elétricos nos EUA apareceu primeiro em Olhar Digital.
