A expansão do Universo e a revolução da ciência

“Se você quer fazer uma torta de maçã do nada, precisará, antes de tudo, inventar o universo”. Essa frase do Carl Sagan, resume de forma poética, não apenas o desafio da compreensão da origem do Cosmos, mas também a complexidade da construção do conhecimento humano. Assim como uma torta de maçã não se faz do nada, cada descoberta científica é resultado de um trabalho lento e minucioso, como os tijolos cuidadosamente assentados um a um, na construção de um grande edifício. O Big Bang, por exemplo, apesar de parecer uma conclusão óbvia da descoberta da expansão do Universo, essa teoria não surgiu do nada. Ela foi construída a partir de diversas observações, hipóteses e modelos, contando com contribuições de alguns dos maiores gênios que já existiram. Mas como chegamos a essa descoberta revolucionária?

A descoberta da expansão do Universo foi uma das maiores revoluções da ciência. Embora modelos matemáticos, como os de Alexander Friedmann e Georges Lemaître, já sugerissem essa possibilidade, não havia evidências observacionais concretas. E mesmo que houvesse indícios, até pouco mais de um século atrás, não tínhamos ferramentas para comprovar que o Universo estava, de fato, em expansão. Nossa forma tradicional de calcular o movimento era dividindo a distância percorrida por um objeto pelo tempo que ele levou para fazer isso. O problema é que nem sequer sabíamos medir a distância das estrelas até o início do século XX, quando a astrônoma americana Henrietta Leavitt desenvolveu uma técnica para calcular distâncias astronômicas a partir das variáveis cefeidas.

Usando o método de Leavitt, Edwin Hubble mediu a distância de várias nebulosas e percebeu que elas eram, na verdade, galáxias distantes, concluindo que o Universo era muito maior do que imaginávamos. Mais tarde, o próprio Hubble percebeu que as galáxias estavam se afastando de nós, mas ele não fez isso medindo seu deslocamento ao longo do tempo, afinal, não vivemos o suficiente para perceber os movimentos do Cosmos. O que Hubble descobriu foi uma espécie de “velocímetro galáctico” escondido na luz das estrelas. Uma forma de medir, com precisão e de maneira instantânea, as velocidades de deslocamento das galáxias pelo Universo, apenas observando a sua luz. Mas para entender como isso foi possível, precisamos falar sobre um dos fenômenos mais fascinantes da física: o comportamento ondulatório da luz.

[ Edwin Powell Hubble e uma fotografia da Galáxia de Andrômeda, cuja distância foi calculada em seu trabalho – Créditos: University of Cambridge ]

No século XIX, o físico escocês James Clerk Maxwell demonstrou que a eletricidade, o magnetismo e a luz são manifestações distintas do mesmo fenômeno. Sendo assim, a luz é uma onda eletromagnética, ou seja, ela se propaga como uma onda. E como toda onda, a luz tem uma amplitude, que depende da intensidade luminosa, e um comprimento, que determina sua cor. As cores que enxergamos nada mais são do que a forma como nossos olhos e cérebro interpretam diferentes comprimentos de onda, desde o violeta e azul, com ondas mais curtas, até o vermelho, com ondas mais longas.

Também por ser uma onda, a luz está sujeita a um fenômeno interessante: o efeito Doppler. Já percebeu como o som da sirene de uma ambulância fica mais agudo quando se aproxima e mais grave quando se afasta? Quando a ambulância se aproxima, ela comprime as ondas sonoras da sirene, tornando o som mais agudo. E quando se afasta, estica o comprimento de onda tornando o som mais grave. Com a luz, acontece algo semelhante. 

Em meio aos seus devaneios geniais, o jovem Albert Einstein certa vez imaginou como seria pedalar uma bicicleta na velocidade da luz. Para qualquer pessoa que o visse se aproximar, iria perceber o físico bem mais azulado, porque, ao se deslocar rapidamente em sua direção, Einstein comprimiria suas ondas luminosas, tornando seus comprimentos mais estreitos e, portanto, mais azuladas. E quanto mais rápido se aproximasse, mais azulado ficaria. Da mesma forma, para aqueles que o vissem se afastar, o mesmo Einstein pareceria mais avermelhado, quanto mais rápido fosse. 

Perceberam? Se pudéssemos medir a variação na cor do ciclista Einstein, poderíamos determinar se ele está se aproximando ou se afastando, e ainda calcular a sua velocidade. Foi esse o velocímetro que Hubble encontrou na luz das estrelas. 

Em 1929, enquanto observava as variáveis cefeidas de galáxias distantes para calcular o quão afastadas elas estavam, Edwin Hubble percebeu que seus espectros eram muito semelhantes aos de estrelas na Via Láctea, exceto por um detalhe: as linhas de absorção – aquelas faixas escuras no espectro que indicam a composição química da estrela – apareciam deslocadas para o vermelho. Foi então que Hubble percebeu algo extraordinário: aquelas galáxias estavam se afastando, e a velocidades surpreendentes, como na bicicletinha imaginada por Einstein. Mas ele foi além.

[ Espectro do Sol (acima) comparado com o do aglomerado de galáxias BAS11 (abaixo). Linhas de absorção do espectro do aglomerado BAS11 deslocado para o vermelho – Créditos: Georg Wiora / wikimedia.org ]

Ao medir a velocidade e a distância de várias galáxias, Hubble constatou que quanto mais distante a galáxia, mais rápido ela se afastava. Isso só fazia sentido em um Universo em expansão! Sua descoberta revolucionou nossa compreensão do Cosmos: em poucos anos, abandonamos a ideia de um Universo estático e limitado e nos deparamos com a vastidão de um Cosmos dinâmico e em constante crescimento.

Se o Universo está se expandindo hoje, faz sentido imaginar que, no passado, ele era menor e mais denso. Foi exatamente essa a conclusão do físico Georges Lemaître, que em 1931 propôs a Teoria do Átomo Primordial – mais tarde conhecida como Teoria do Big Bang. Segundo essa ideia, há cerca de 13,8 bilhões de anos, todo o Universo estava concentrado em um único ponto infinitamente denso e quente, que se expandiu dando origem a tudo o que existe – inclusive à torta de maçã do Sagan.

[ Galáxias no espaço profundo registrado pelo Telescópio Espacial James Webb – quanto mais avermelhada, mais distante e mais rapidamente a galáxia está se afastando – Créditos: NASA/STSci ]

A descoberta da expansão do Universo foi um marco na cosmologia moderna, abrindo caminho para novas revelações, como a existência da energia escura – a misteriosa força que acelera essa expansão.

E assim, a cada nova descoberta, a cada nova observação, assentamos mais um tijolo na grande construção do conhecimento humano. Passo a passo, seguimos desvendando os mistérios do Universo, sempre em busca de compreender o que há além do nosso horizonte cósmico.

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