Na COP30, que acontece em Belém (PA), a inteligência artificial (IA) apareceu em conversas sobre clima. O tema ganhou força nos corredores e nos documentos oficiais não como tendência tecnológica abstrata, mas como um ponto de virada.
Ao mesmo tempo em que impulsiona pesquisas, monitoramento ambiental e previsão de eventos extremos, a IA também amplia o consumo de energia e pressiona a infraestrutura digital. Este paradoxo se tornou um dos debates-chave da conferência.
A percepção é que a IA passou a ser tratada como aliada e ameaça ao mesmo tempo, segundo a Folha de S. Paulo. Entre análises técnicas da ONU, estudos divulgados antes e durante o encontro e iniciativas como a AI Climate Academy, cresce a tentativa de equilibrar potencial e risco.
Paralelamente, o Brasil tenta transformar a COP30 em vitrine ao lançar um plano de governança climática integrado. Você vai entender tudo isso nesta matéria. Mas vamos por partes.
IA como aliada e ameaça nas discussões da COP30
A presença da inteligência artificial nas negociações climáticas não é exatamente nova, mas ganhou outra dimensão desde a COP28, realizada em Dubai em 2023.

Naquele ano, os países reconheceram oficialmente a IA como uma ferramenta capaz de contribuir para o combate às mudanças climáticas. Mas alertaram para riscos associados ao avanço acelerado dessa tecnologia.
Em Belém, na COP30, esse debate amadureceu. A tecnologia aparece como um recurso poderoso para acelerar pesquisas, prever desastres e monitorar ecossistemas sensíveis. No entanto, também é considerada um fator de pressão crescente sobre recursos naturais e energia.
Pelos lados positivos, negociadores e especialistas apontam aplicações já consolidadas. Há sistemas de IA usados para prever eventos extremos, monitorar nível do mar, acompanhar poluição e mapear desmatamento — caso da ferramenta PrevisIA, citada pelo jornal.
Além disso, a tecnologia tem sido usada por cientistas para acelerar análises complexas e por jornalistas ambientais em investigações sobre carbono e desmatamento. Em alguns países, como a Índia, algoritmos ajudam agricultores a planejar safras diante de riscos climáticos, o que reduz endividamento e incentiva culturas de valor agregado maior.
Mas esse avanço tem custos. O relatório da UNFCCC, divulgado antes da conferência, alerta que o alto consumo energético de data centers pode neutralizar parte dos benefícios climáticos da IA.
- UNFCCC significa United Nations Framework Convention on Climate Change (em português, Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima). É o tratado internacional que estrutura a governança climática global desde 1992 (Rio-92) e que organiza as COPs – as Conferências das Partes.
Além disso, há desigualdade no acesso à tecnologia. Países de baixa renda, por exemplo, têm infraestrutura limitada para aproveitar suas vantagens.
Em paralelo a isso, crescem os temores de usos indevidos – por exemplo: o apoio a atividades de exploração de combustíveis fósseis e a circulação de desinformação sobre mudanças climáticas.
Esse conjunto de riscos tem impulsionado o debate por uma regulação específica dentro da convenção do clima.
Documentos da ONU e iniciativas lançadas na conferência
Além do debate conceitual, a COP30 tem sido palco para novos documentos, diretrizes e iniciativas internacionais ligados ao uso de IA no clima.

A UNFCCC publicou relatórios que listam aplicações consideradas bem-sucedidas e reforçam a necessidade de métricas globais para medir o impacto da infraestrutura digital nas ações climáticas.
A ONU destaca que os investimentos em IA cresceram fortemente na última década, mas ainda faltam padrões claros para garantir que esses sistemas sejam transparentes, justos e responsáveis, evitando vieses e usos que possam gerar danos ambientais.
Em Belém, uma das novidades foi o lançamento da AI Climate Academy, iniciativa conjunta da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), União Internacional de Telecomunicações (UIT) e Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
O programa oferecerá cursos e capacitações presenciais para países em desenvolvimento, começando pelos amazônicos. E deve evoluir para um instituto dedicado a estudos sobre tecnologias digitais e clima.
Para a Unesco, o objetivo é ampliar o acesso ao conhecimento e evitar um cenário no qual apenas países ricos se beneficiem da IA enquanto os mais vulneráveis enfrentam os maiores impactos da crise climática.
Ao mesmo tempo, a entidade reforça que a desinformação sobre clima impulsionada por IA já representa um risco real à segurança pública.
Leia mais:
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- COP30 em Belém: O que está em jogo na ‘COP da Verdade’
- Mudanças climáticas: o que são e quais suas causas e efeitos no planeta
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O plano brasileiro e a governança multinível
Enquanto o debate internacional sobre IA avançava na COP30, o Brasil aproveitou o encontro para lançar o Plano de Aceleração de Soluções (PAS) em Governança Multinível.

A iniciativa busca integrar diferentes níveis de governo – municipal, estadual e federal – na implementação das metas climáticas do Acordo de Paris.
O plano se apoia em quatro pilares:
- Decisão informada por risco;
- Capacitação técnica;
- Financiamento público e privado;
- Governança inclusiva.
Ele prevê metas até 2030, como a incorporação de estruturas de governança multinível em pelo menos 120 planos climáticos nacionais e locais, além da capacitação de seis mil servidores e profissionais de países parceiros.
Segundo o governo brasileiro, a eficácia das políticas climáticas depende dessa coordenação ampliada, já que são estados e municípios que executam ações como adaptação urbana, proteção da floresta e descarbonização de frotas.
O Brasil também foi nomeado co-presidente da coalizão CHAMP, que aproxima governos nacionais e subnacionais em projetos climáticos e financeiros.
Isso reforça a estratégia do Brasil de se posicionar como articulador global em governança ambiental. Para o Ministério do Meio Ambiente, sem compartilhamento de dados, tecnologia e financiamento entre todos os níveis, nenhuma meta climática sai do papel.
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