Análise: Absolum é absoluto e atualiza regras das brigas de rua nos games

2025 não está para brincadeira quando o assunto é jogo bom que não depende de orçamento estratosférico para sair do papel. Quando a ideia é boa, dentro ou fora da caixa, e o estúdio sabe colocá-la em prática, executando o que faz de melhor, surge um projeto do calibre de Absolum.

Absolum é a primeira aposta original da Dotemu, desenvolvedora e publicadora francesa que tem o gênero beat’ em up em seu DNA. Tendo se encontrado nesse estilo, a Dotemu nos trouxe, num passado recente, nada menos que Streets of Rage 4 e Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge, dois dos principais representantes da porradaria 2D na atualidade.

Elogiar o trabalho da Dotemu é chover no molhado, ainda mais se você já passou dos 30, mas já estava na hora de o estúdio se aventurar em algo diferente e diversificar seu portfólio, isto é, ir além de adaptar franquias famosas ou lançar sequências de jogos já consolidados. Absolum é o retrato de anos de trajetória dedicados a refinar as brigas de rua e, portanto, o “magnum opus” dos franceses.

Uma beat’ em up praticamente infinito

Órfãos do fliperama sabem que jogos beat’ em up têm a duração curta como seu calcanhar de Aquiles. Historicamente, são games que prezam pela repetição e que têm, em prol da longevidade, a dificuldade como elemento-chave da experiência. Em títulos mais modernos, no entanto, é possível calibrar o desafio, mas não há como burlar a limitação do tempo sem forçar uma sobrevida, digamos, meio artificial ao conteúdo.

Pensando em resolver o maior revés do gênero de uma vez por todas, a Dotemu, com Absolum, cria um ciclo praticamente infinito de trocação de soco, unindo o combate descerebrado das brigas de rua à imprevisibilidade e ao alto fator replay do rogue – ou melhor, do roguelite, para ser mais exato. A pergunta que fica no ar é: como não pensaram nisso antes?

História? Ah, sim, tem também

Como manda a cartilha do gênero, a trama é um mero pretexto para justificar a pancadaria. Na maior parte do tempo, sendo sincero, você nem vai se importar em ler diálogos, mesmo que os textos estejam bem adaptados ao português, e sim estará focado em se preparar psicologicamente para o próximo embate. Tanto que existe até um recurso para acelerar as interações verbais.

Cá entre nós, beat’ em up não é bem o formato mais adequado para desenvolver uma baita história. Ainda assim, há um pano de fundo intrigante que sustenta a narrativa: cabe a você, como membro de uma força rebelde, recuperar a magia de Talamh e as terras que o Rei Sol Azra tomou à força sob seu domínio tirano.

Absolum já está disponível para jogar.

Formado na escola Hades, Absolum não conquista tanto pela história em si, mas pelos personagens bem construídos que encontramos ao longo da jornada. Como um bom roguelike, não são apenas os caminhos que mudam a cada nova rodada: as conversas com NPCs também se renovam, sempre revelando desdobramentos no enredo para quem valoriza uma boa lore.

Quebra-pau com profundidade

Quando pensamos em briga de rua, a primeira pergunta que vem à cabeça é: quão satisfatório é esmurrar os inimigos enquanto massacramos os botões? Pois fique em paz: o combate de Absolum é simplesmente delicioso e entrega uma versão modernizada, mas ainda fiel às tradições dos beat’ em ups com pegada retrô.

Isso significa que os personagens ainda se movem lentamente e dão aqueles passinhos curtos, como se estivessem andando na maior “marra”. O que diferencia Absolum de seus parentes próximos, contudo, é a densidade do seu sistema de batalha, mais agressivo que o normal, com combos capazes de fazer inveja a hack and slashes e musous da vida.

À medida que progredimos nas partidas, novos movimentos são destravados para o personagem, o que inclui desde golpes extras na combinação padrão de ataques leves até habilidades passivas, como aplicar buffs aos especiais ou causar dano elemental ao esquivar, deixando um rastro traiçoeiro para os oponentes.

Parry e esquiva renovam porradaria

Quando digo que o combate é mais “denso”, isso se deve também às mecânicas defensivas. Diferentemente de outros títulos de porrada em visão lateral, você pode reagir às ações do inimigo sem qualquer restrição, seja por meio da técnica de evasão, seja aparando a investida rival no último segundo, tal como num bom jogo de ação, abrindo uma janela para revidar à altura.

O parry é, disparado, a mecânica que mais me agrada nos videogames e, aqui, é responsivo e absurdamente satisfatório. Absolum oferece tantas possibilidades de se safar nos combates que é perfeitamente viável sair ileso, isto é, sem levar um trisco de dano sequer, caso você seja habilidoso o bastante. É desafiador, sim, dada a dificuldade característica dos rogues, mas está longe de ser impossível.

Novo game da Dotemu capricha no combate.

Somadas aos combos, as habilidades especiais cumprem um papel fundamental e estão ali para nos livrar de enrascadas. Afinal, é comum ser “prensado” contra as paredes por hordas intermináveis de inimigos que, no calor do momento, acabam soterrando nosso herói. E se você estiver jogando no modo cooperativo, então, seja no multiplayer ou localmente, boa sorte: há momentos em que a bagunça fica simplesmente indistinguível, ainda que divertida ao extremo.

Esse, inclusive, é um ponto de ressalva: não há indicadores que destaquem o personagem em meio ao caos. Na prática, a falta de clareza visual faz com que o jogador se sinta perdido e, por vezes, frustrado por não saber a posição exata do seu boneco. O jeito, então, é macetar botões loucamente até que ele reapareça no cenário.

Rogue com briga de rua: dá mais que certo

A receita do bolo do gênero rogue você conhece bem: inicie uma rodada do jeito que veio ao mundo, aprimore as habilidades do personagem, falhe miseravelmente, aplique melhorias permanentes e repita o processo. Absolum não é diferente no loop de gameplay, mas faz uma coisa que outros não fazem: guarda o progresso no mapa para que você consiga visualizar caminhos e áreas que já visitou.

Por ser mais roguelite do que like, achei que Absolum é meio “mão fechada” no quesito upgrades, justamente por concedê-los a conta-gotas. Em compensação, é generoso na quantidade de aprimoramentos fixos que entrega para cada uma das quatro classes, favorecendo a construção das mais variadas builds. Olha, você vai gastar um tempo considerável para desbloquear tudo.

Absolum traz grandes acertos em sua fórmula.

O que quero dizer com isso é que não há um sentimento de progresso tão evidente quando aplicamos upgrades de uma rodada para outra, o que, ao que tudo indica, me parece uma decisão deliberada da equipe que concebeu o jogo. Há quem goste de rogues cuja evolução é mais sutil, ou seja, em que os upgrades demoram a impactar o desempenho do personagem, exatamente como acontece aqui. Eu, particularmente, prefiro que a progressão flua rapidamente.

Você sente, por outro lado, que fica mais habilidoso conforme avança, memoriza os diferentes biomas e aprende os padrões de ataque dos inimigos, em especial dos chefes. Caso não seja exatamente um perito em roguelikes, não se preocupe: o título traz recursos de acessibilidade que permitem reduzir o dano recebido ou amplificar o causado, tudo ajustável por meio de um menu.

Vale a pena?

Absolum quebra a sina da repetição característica do gênero ao qual pertence e se concentra em diversificar a experiência, agregando mais profundidade ao beat’ em up e, sobretudo, mesclando elementos de roguelike com muita identidade. Ele sabe ponderar suas influências em Hades, tanto no estilo artístico quanto na estrutura, enquanto preserva o DNA que fez a Dotemu ser quem é. Para fãs do estilo, é imperdível.

Nota: 90

Prós (pontos positivos):

  • Gostoso de jogar: a mistura perfeita de beat’ em up com rogue;
  • Combate com uma profundidade inesperada para o gênero;
  • Variedade de builds graças aos upgrades;
  • Temática de fantasia sombria que cai muito bem;
  • Recursos de acessibilidade para quem não é perito em briga de rua;
  • Trilha fenomenal e visual lindo, claramente inspirado em Hades.

Contras (pontos negativos):

  • Não há uma percepção evidente de progresso entre uma rodada e outra;
  • Poucos indicadores para destacar o personagem em meio ao caos.

Uma cópia de Absolum foi gentilmente cedida pela Dotemu para o propósito de análise no PS5 Pro. O jogo está disponível para PS4, PS5, PC e Nintendo Switch.

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