Como a caça em massa moldou a sobrevivência humana há 50 mil anos

Um novo estudo aponta que a capacidade de organizar caçadas em massa, essencial para a sobrevivência do Homo sapiens, começou a surgir há cerca de 50 mil anos. Publicada na revista Scientific Reports, a pesquisa sugere que essa coordenação avançada pode ter dado à nossa espécie uma vantagem significativa sobre outros hominídeos, como os Neandertais.

A análise do sítio arqueológico de Nesher Ramla, em Israel, que preserva vestígios de até 120 mil anos, buscou identificar práticas anteriores de caça cooperativa, ajudando a entender quando a colaboração ampla se tornou decisiva para a evolução da espécie humana.

Centenas de auroques foram mortos em Nesher Ramla – faziam parte da mesma manada? Crédito: EchoBuilder – Shutterstock

Caça pré-histórica e o despertar da cooperação humana

A pesquisa sobre a caça em massa e a cooperação humana na pré-história trouxe à luz pontos-chave sobre o desenvolvimento das sociedades antigas:

  • A caça em massa, que envolve o abate e processamento de múltiplos animais de rebanho, é um indicador arqueológico fundamental de cooperação em grande escala entre grupos humanos;
  • No sítio de Nesher Ramla, datado de 120 mil anos, hominídeos parecidos com Neandertais não realizavam caçadas em massa, mas sim abates de animais individuais em eventos menores e isolados;
  • A análise de ossos de auroques revelou que os animais abatidos ali não faziam parte da mesma manada e apresentavam um perfil de mortalidade inconsistente com uma caçada em grande escala;
  • O estudo indica que, há cerca de 50 mil anos, o Homo sapiens já havia desenvolvido de forma consistente a capacidade de organizar caçadas coletivas sustentadas por comunicação eficiente;
  • Essa habilidade de cooperação pode ter sido um fator decisivo para a sobrevivência e o sucesso evolutivo do Homo sapiens em comparação com outros hominídeos.

Desvendando os segredos da caça antiga em Nesher Ramla

Os últimos 50 milênios testemunharam uma transformação única na história humana, marcada por uma notável “atualização cognitiva” que impulsionou a expressão artística e comportamentos ritualísticos. Esse fenômeno, conhecido como o Grande Salto Adiante, é frequentemente associado à singular capacidade do Homo sapiens de se comunicar, formar redes sociais e colaborar. Para compreender a gênese dessas habilidades, os pesquisadores buscaram evidências de caça em massa em períodos anteriores.

Segundo os autores do estudo, “a caça em massa, que se refere ao abate simultâneo e ao subsequente processamento de vários animais de rebanho, pode envolver altos níveis de cooperação e comunicação entre inúmeras pessoas de diferentes grupos ao longo de vários dias, às vezes mais. Como tal, é um importante indicador arqueológico de cooperação em larga escala.” Essa definição foi a bússola para a investigação no sítio de Nesher Ramla, em Israel, onde uma vasta quantidade de ossos de auroques, com marcas de abate humano, foi descoberta.

Vista geral da escavação no sítio de Nesher Ramla. Crédito: Yeshurun, R., Hartman, G., May, H. et al.

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O local, habitado por hominídeos com características neandertais desde o Paleolítico Médio, era um potencial palco para a caça em grupo. A hipótese inicial era que esses hominídeos poderiam ter aprendido técnicas de caça em massa observando grupos de humanos anatomicamente modernos que viviam nas proximidades. 

No entanto, uma análise minuciosa dos restos dos auroques contradisse essa ideia. Os pesquisadores notaram que todos os animais abatidos eram fêmeas adultas, um padrão incomum para o abate de uma manada inteira. Além disso, testes isotópicos nos ossos revelaram que essas grandes criaturas não viviam juntas, desmistificando a noção de uma caça em debandada.

(A) Sobreposição do fragmento da tíbia distal sobre uma tíbia de auroque completa. (B) Reconstrução da superfície da tíbia distal com o fragmento de sílex (em vermelho). (C) Secção transversal do osso e do fragmento de sílex incrustado (em 3D). Crédito: Yeshurun, R., Hartman, G., May, H. et al.

“Nossas análises e dados não corroboram a hipótese de que Nesher Ramla tenha sediado eventos de caça em massa, sugerindo, em vez disso, a ocorrência de múltiplos eventos de caça em pequena escala,” afirmam os cientistas responsáveis pela pesquisa. Essa conclusão foi reforçada pela descoberta de um animal que sobreviveu a uma flechada em uma caçada anterior, sendo abatido pelo mesmo grupo humano posteriormente. Tais detalhes ilustram a natureza individualista e menos coordenada das atividades de caça no local.

O estudo conclui que os hominídeos de Nesher Ramla não tinham a comunicação e a cooperação necessárias para organizar caçadas em massa. Por isso, acabaram em desvantagem em relação aos Homo sapiens, que trabalhavam melhor em grupo e conseguiam reunir mais pessoas para caçadas grandes.

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