A existência da série Pacificador é uma das coisas mais peculiares que já vi na indústria de filmes e séries de super-heróis. Após deixar a Marvel em 2019, o diretor e roteirista James Gunn dirigiu um novo filme do Esquadrão Suicida em 2021, colocou John Cena para interpretar um anti-herói nacionalista pouco conhecido e, depois, transformou o personagem no protagonista de sua própria série.
E tudo isso aconteceu em meio a uma grande crise da DC: a primeira temporada foi lançada em 2022, quando o universo criado por Zack Snyder estava chegando ao fim, e a produção ainda se conectava à antiga Liga da Justiça.
Em seguida, ainda em 2022, a Warner decidiu começar do zero com um novo universo chamado DCU, liderado pelo próprio James Gunn. Agora, após já ter lançado o filme Superman e a animação Comando das Criaturas, o diretor faz John Cena vestir novamente o capacete do guardião da paz, após a primeira temporada ter recebido ótimas avaliações.
A grande questão é: após tantas idas e vindas, esse retorno dá certo? A resposta é sim, e eu explico melhor no texto a seguir, sem spoilers da segunda temporada de Pacificador.
Pacificador retorna conectado com Superman, mas com o mesmo estilo
Antes de prosseguir, um disclaimer: não acompanhei a primeira temporada de Pacificador durante o lançamento e só dei uma chance à série após assistir Comando das Criaturas e Superman. Como confirmado pelo novo líder da DC, James Gunn, a série agora está conectada às produções do DCU.
Felizmente, a transição para o novo universo acontece de maneira natural, engraçada e sem perdas para o personagem. Após maratonar a primeira temporada completa no HBO Max, a experiência de ver cinco episódios da nova leva, liberados antecipadamente pela Warner, foi fluida, como se nada tivesse acontecido nos últimos anos na divisão da Warner.
A única diferença é que, agora com total controle, James Gunn dobra a aposta nas conexões dentro do universo. Embora não seja necessário assistir às outras produções para aproveitar a segunda temporada de Pacificador — nem mesmo o Esquadrão Suicida de 2021 — acompanhar as demais obras garante referências e easter eggs divertidos.
A única exceção fica para Superman, já que um conceito importante do filme aparece como ponto central da série — até por isso o longa-metragem será lançado digitalmente antes da estreia da segunda temporada de Pacificador. No entanto, explicações rápidas fornecidas pela série ajudam os espectadores de primeira viagem a entrarem na onda mesmo sem conhecer o novo longa de Clark Kent.
Um multiverso de John Cena
Além de expandir o DCU, a segunda temporada de Pacificador entra na onda do multiverso, mas de um jeito que se encaixa muito bem na dinâmica da série. Após os acontecimentos traumatizantes do fim do primeiro ano, Chris Smith luta para seguir em frente como herói e falar sobre seus sentimentos com a durona Emilia Harcourt — que ganha ainda mais protagonismo nos novos episódios.
Não bastasse isso, o personagem ainda tem que lidar com um fantasma do passado: Rick Flag Sr., que busca vingança após o Pacificador matar seu filho. Em meio às crises existenciais e de relacionamento, o anti-herói encontra uma solução para seus problemas no armário: usando uma fenda interdimensional presente na casa do pai, ele descobre uma dimensão em que sua vida é perfeita.
Enquanto histórias de multiverso já estão ficando batidas, a abordagem de James Gunn em Pacificador é memorável. Graças aos problemas do protagonista, toda a situação vai além das variantes e se torna uma crise existencial.
Durante muitos momentos, a produção faz você se questionar, assim como o personagem: afinal, vale a pena largar tudo para viver uma vida feliz que não é sua? Esse clima existencial, aliado ao humor e à violência da série, torna a segunda temporada de Pacificador uma experiência diferenciada em tempos de excesso de filmes de super-heróis.
O meio-termo entre MCU e The Boys
Durante os cinco episódios que assisti da segunda temporada, senti que Pacificador está em um terreno que fica entre o auge do MCU, o universo cinematográfico da Marvel, e o mundo sanguinário de The Boys. Essa mistura de sangue e humanidade garante um clima leve, mas cheio de ação e reflexão.
Enquanto o MCU tenta se reinventar mostrando um lado mais humano com produções como Quarteto Fantástico, sem grande impacto no público, The Boys se tornou um hit global subvertendo a ideia de heroísmo. A produção do Prime Video mostra que os heróis nem sempre são bonzinhos, com episódios repletos de sangue e sexo, que quase sempre visam chocar o público.
“A mistura de sangue e humanidade garante um clima leve, mas cheio de ação e reflexão.”
O acerto de Pacificador é misturar esses dois conceitos com naturalidade e maestria. O protagonista e seu grupo de amigos claramente têm problemas e não passariam em um teste psicotécnico, o que torna suas ações benevolentes bem sanguinárias, mas sem exagero para tudo se tornar simplesmente gore.
Essa ideia já estava presente na primeira temporada, mas retorna com ainda mais força nos novos episódios. Todo o conteúdo mais pesado é inserido de forma orgânica na trama, encaixando-se dentro do DCU sem parecer forçado ou uma sátira, como acontece em The Boys.
Personagens mais humanos, até os animais
No estilo James Gunn, o núcleo principal também esbanja humanidade: mesmo com comportamentos contestáveis, é possível se identificar e se importar com Chris, Harcourt e os demais membros da 11th Street Kids. Até mesmo o Vigilante, que muitas vezes serve de alívio cômico, ganha mais camadas nesta temporada.
O diretor também continua aproveitando seu talento para escrever animais em cena, permitindo que a águia Eagly abra suas asas e ganhe um arco próprio interessante e engraçado. O mascote do Pacificador se torna peça-chave na narrativa, funcionando como personagem e não apenas como aparato narrativo.
O único ponto em que Gunn pesa a mão, a meu ver, é o núcleo militar da ARGUS. Apesar do potencial do grupo liderado por Rick Flag Sr., as forças especiais apresentam momentos bobos demais. Isso quebra o ritmo da história e permite que o espectador se desligue do universo em prol de piadas ao estilo clássico do MCU, com tempo excessivo de tela.
Vale a pena?
A segunda temporada de Pacificador consolida o universo do anti-herói na televisão e mostra que James Gunn, com controle criativo total sobre o DCU, tem ouro nas mãos. Além de ter recuperado a imagem de Superman em seu filme, o roteirista dobra a aposta com John Cena, trazendo episódios repletos de ação, humanidade e originalidade.
Mesmo com deslizes, Pacificador retorna com episódios cheios de surpresas, que divertem e emocionam. Com esse combo, a série mostra que o DCU de James Gunn tem um futuro promissor se mantiver este ritmo criativo, que esbanja personalidade desde a abertura até as cenas pós-créditos.
Pacificador Temporada 2 estreia em 21 de agosto no HBO Max. Você vai assistir? Comente nas redes sociais do Minha Série! Estamos no Threads, Instagram, TikTok e até mesmo no WhatsApp. Venha acompanhar filmes e séries com a gente!