Os investimentos em inteligência artificial (IA) atingiram tamanha escala que até as gigantes de tecnologia repensam como levantar dinheiro. Meta, OpenAI e xAI – empresas no centro da corrida global pela IA – têm fechado acordos bilionários com Wall Street para financiar data centers e infraestrutura.
Segundo o Wall Street Journal, esses “megadeals” de IA envolvem esquemas financeiros (legais) complexos, que combinam dívida, ações e garantias inéditas. A aposta é sustentar a expansão da IA sem sobrecarregar os balanços das empresas. Mas isso acende alertas sobre o risco de uma nova bolha no mercado de tecnologia.
Como big techs têm financiado seus data centers de IA
A Meta, dona do Facebook e do Instagram, está por trás de um dos acordos mais ousados: o projeto Hyperion, um data center de US$ 30 bilhões (cerca de R$ 168 bilhões) construído em parceria com o fundo Blue Owl Capital.
Para bancar a obra, a empresa combinou instrumentos típicos de diferentes mundos — private equity, financiamento de projeto e títulos de dívida — numa engenharia financeira inédita.
- Private equity: Investimento feito por fundos que compram participação (ações) em projetos ou empresas que ainda não estão listadas na bolsa. No caso da Meta, o fundo Blue Owl investiu dinheiro em troca de uma fatia do projeto do data center – ou seja, vira “sócio” temporário, esperando lucro no futuro;
- Financiamento de projeto: Tipo de empréstimo no qual o dinheiro é concedido com base no próprio projeto e não na empresa. O ativo (como o data center) serve de garantia. Assim, se o projeto não der certo, os credores ficam com ele – não com toda a empresa;
- Títulos de dívida: Papéis emitidos por empresas para pegar dinheiro emprestado de investidores, prometendo pagar de volta com juros. É como um empréstimo dividido em “pedaços” vendidos no mercado.
O arranjo permite que a Meta use o data center como locatária, em vez de proprietária, o que reduz o impacto da dívida em seu balanço.
Outro megaprojeto é o Stargate, dentro do qual está a parceria entre a OpenAI, desenvolvedora do ChatGPT, e a Oracle, sua principal provedora de computação em nuvem.
Avaliado em US$ 38 bilhões (cerca de R$ 213 bilhões), o plano é construir dois data centers gigantescos nos Estados Unidos – um no Texas e outro em Wisconsin.
O financiamento será feito por mais de 30 bancos, liderados por JPMorgan e MUFG, que ofereceram um empréstimo de cinco anos a uma taxa de 6,4%.
O detalhe é que a OpenAI, por ser uma startup, não tem crédito suficiente para tomar esse dinheiro diretamente. Então, o contrato é garantido pela Oracle, que pagará o aluguel das estruturas.
A xAI, de Elon Musk, também aposta pesado. Seu projeto Colossus 2, no Tennessee, precisa de até US$ 20 bilhões (cerca de R$ 112 bilhões) para sair do papel – dinheiro destinado à compra de 300 mil chips da Nvidia.
O financiamento envolve fundos como Valor Equity Partners e Apollo Global Management, que estão montando um veículo de investimento para captar recursos junto a outros fundos e investidores privados.
Parte do valor virá em forma de dívida com juros de 10,5%. E outra parte como participação acionária. Esse modelo reflete tanto a ambição quanto o risco do plano de Musk.
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Por que esses acordos têm preocupado o mercado
Apesar de movimentarem cifras impressionantes, esses “megadeals” acenderam um sinal de alerta em Wall Street. Para financiar a corrida da IA, empresas e bancos têm criado estruturas cada vez mais complexas. E potencialmente arriscadas.
A lógica é transferir parte do risco para investidores privados, oferecendo juros altos e garantias inéditas. Mas, segundo o Wall Street Journal, essa engenharia lembra práticas de períodos que antecederam bolhas financeiras: muita inovação e pouca clareza sobre o que acontece se o mercado esfriar.
Analistas ouvidos pelo WSJ destacam que o volume de dívida e a velocidade dos investimentos em IA são inéditos. O gestor Dan Ivascyn, da Pimco, que também investe no projeto da Meta, disse que há “muita complacência” em meio ao entusiasmo.
Ivascyn lembrou que, após anos de crescimento econômico, o mercado tende a subestimar riscos e a criar mecanismos financeiros cada vez mais sofisticados para continuar a expandir. Isso aumenta a vulnerabilidade quando o ciclo muda.
A preocupação maior é que a euforia em torno da IA esteja inflando uma nova bolha tecnológica. Com empresas se endividando para construir infraestrutura e investidores apostando em retornos rápidos, qualquer desaceleração pode causar um efeito dominó.
Por enquanto, bancos e fundos seguem apostando alto. Mas já admitem que a sustentabilidade desses acordos será testada assim que o ritmo frenético de investimentos em IA começar a desacelerar.
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