O fim da IA está próximo?

A bolha da inteligência artificial está prestes a estourar. Não sou eu quem está dizendo: dezenas de especialistas, analistas e jornalistas já levantam essa possibilidade. Até Jeff Bezos, fundador da Amazon, afirmou que o mercado das inteligências artificiais é, de fato, uma bolha.

Tal como um balão inflado em excesso, quando a bolha se torna grande demais, seu rompimento é estrondoso, impactando drasticamente a economia, podendo desencadear recessões e uma reestruturação completa do mercado. Neste texto, explicarei o conceito por trás de uma bolha especulativa, lembrarei uma crise que eclodiu no final do século passado e apresentarei os sinais de que um novo estouro está iminente — e o resultado não será nada agradável.

O conceito de bolha especulativa

Comecemos pelo básico: a bolha especulativa. Também conhecida como bolha econômica, este é um fenômeno do mercado financeiro em que uma parcela significativa do preço de um ativo se desvia de seu valor real fundamental.

Quando uma empresa é listada na bolsa de valores, ela emite ações que representam frações de seu capital social. Dessa forma, investidores podem adquirir participações e se tornar sócios. Quanto maior for a porcentagem de ações, maior o retorno via dividendos (parcelas do lucro distribuídas aos acionistas). Caso não haja dividendos, o lucro ou prejuízo do investidor dependerá da valorização ou desvalorização das ações na compra e venda.

O preço diário das ações flutua, mas sua base é determinada pelo valuation, uma avaliação do valor de mercado da empresa ancorada em dados concretos como Fluxo de Caixa Descontado, Múltiplos de Mercado e Valor Patrimonial. Embora seja um cálculo complexo e sem regras rígidas, o valor da empresa (e, consequentemente, de suas ações) é, fundamentalmente, ancorado em fatos, números e dados. Contudo, esse valor é altamente volátil e reage a notícias, informações, negociações e decisões que alteram as expectativas futuras da companhia.

Mercado de ações é baseado em realidade e expectativas (Imagem: primeimages / GettyImages)

Como uma bolha é criada

Se o McDonald’s decidisse acabar de vez com o Big Mac, as ações cairiam bastante. Por outro lado, se o streamer Speed falasse ao vivo que o Whopper do Burguer King é o melhor lanche do mundo, as ações desta empresa aumentariam. Acontecimentos da realidade afetam diretamente o desempenho de uma empresa, influenciando consequentemente o valor na bolsa de valores.

Mas o que ocorre quando a especulação é tão grande que a maior parte do valor de uma ação não tem embasamento teórico? É assim que se forma uma bolha especulativa.

O processo inicia-se com um fato e uma expectativa inicial, plausível, por parte dos acionistas em um determinado setor. O fluxo de notícias gera interesse em novos investidores, que se apressam para entrar no negócio. Com o aumento da demanda, o preço das ações cresce bastante, superando em muito o seu valor fundamental. Esse sucesso aparente estimula o surgimento de novos negócios que tentam replicar os resultados, mas com menor solidez nos seus produtos, carregando consigo um volume de incertezas disfarçado de potencial de lucro.

O estouro da bolha

Uma vez que a bolha está formada e os primeiros questionamentos surgem, intelectuais e especialistas tendem a minimizar os receios, alegando que “as regras do jogo mudaram” e que os críticos estão antiquados ou desconectados da realidade.

A manutenção da bolha exige um fluxo contínuo de novos aportes, e os investidores que chegam tardiamente são impulsionados pela ganância ou pelo desespero de não “perder o bonde”. Nesse ponto, as expectativas se tornam inteiramente irreais e os preços não se sustentam mais.

Quando o mar fica vermelho, a desconfiança reina (Imagem: peshkov / GettyImages)

Quando a realidade se impõe, a certeza do grande retorno dá lugar ao pavor. Por um comportamento de manada ou pânico, ocorre uma liquidação generalizada – a venda maciça de ativos simultaneamente –, o que faz a bolha estourar. O setor é descredibilizado, acionistas acumulam prejuízos e, dependendo da dimensão do mercado, um efeito em cadeia atinge a economia de todo o país.

A Bolha PontoCom

Um exemplo clássico ocorreu no final dos anos 90: a chamada Bolha PontoCom. Naquela época, a internet deixava de ser uma promessa para se tornar o presente. Mais pessoas adquiriam computadores domésticos, o acesso a salas de bate-papo se popularizava e novas formas de entretenimento surgiam.

O ponto de virada foi quando a Netscape, uma das criadoras dos primeiros navegadores, foi avaliada em US$ 2,9 bilhões. Esse evento não apenas atraiu a atenção dos investidores para o potencial digital, como abriu caminho para que novas empresas do setor chegassem com força à bolsa. Mais consumidores, mais serviços digitais, mais tempo e dinheiro investidos nessas tecnologias – era um continente de oportunidades a ser explorado.

Uma imagem que vale quase US$ 3 bilhões (Imagem: Reprodução)

Enquanto empresas como eBay, Yahoo e Amazon se valorizavam, muitas startups sem solidez começaram a receber investimentos apenas por estarem inseridas nesse contexto. Ao mesmo tempo, empresas eram incorretamente avaliadas devido ao fervor do mercado, e investidores revendiam ações por valores exorbitantes, como se os negócios valessem milhões em pouco tempo.

As consequências do colapso

Após algum tempo, como era previsível, diversos analistas notaram que os valores das ações das empresas PontoCom eram irreais, visto que a maioria mal gerava lucro. Isso levou à liquidação das ações, resultando no fechamento de mais de 500 negócios e gerando perdas financeiras colossais para os investidores.

O impacto foi gigantesco. A NASDAQ, o segundo maior mercado de ações do mundo, que havia atingido uma máxima histórica, sofreu uma queda abrupta, retornando em 2002 ao mesmo patamar de 1995, antes da formação da bolha. As empresas sobreviventes sentiram o baque: a ação da Amazon, por exemplo, caiu de US$ 107 para US$ 7, enquanto a Apple foi de US$ 5 para apenas US$ 1.

A confiança do mercado financeiro desmoronou, mas as companhias que resistiram à crise encontraram um caminho promissor: menos concorrência e muita mão de obra qualificada disponível. Quem soube se aproveitar dessa conjuntura, como Google, Apple e Amazon, domina o mercado atual.

A bolha da IA

Avançando mais de 20 anos, vamos entender o cenário atual. Existe um grupo conhecido como Magnificent 7, composto por NVIDIA, Microsoft, Alphabet (controladora do Google), Apple, Meta, Tesla e Amazon, que representa cerca de 35% do valor total do mercado de ações dos EUA. Em outras palavras, mais de um terço do mercado da maior potência econômica do planeta está concentrado nessas empresas, que são as protagonistas da bolha da IA, juntamente com a OpenAI, Oracle e outras.

Algumas das empresas mais fortes do setor de IA (Imagem: Financial Times)

Essas companhias estariam utilizando uma tática conhecida como round-tripping: uma empresa capta US$ 100 milhões em investimento e faz um acordo de US$ 100 milhões com outra, que repassa o valor para uma terceira, que, por sua vez, retorna a quantia para a empresa inicial. Esse ciclo artificial de transações internas gera uma valorização gigantesca para todas as envolvidas, podendo em alguns casos atingir até 50 vezes a sua receita, o que atrai novos investimentos e perpetua o ciclo de acordos.

O problema é que o aumento astronômico no valor de mercado, causado por essa técnica teoricamente ilegal em não se justificará a menos que o lucro gerado seja igualmente gigantesco — e esse não é o cenário atual. A OpenAI, por exemplo, segundo análise do JPMorgan, só deve começar a gerar lucro real a partir de 2029. No entanto, a própria empresa projeta que, até esse ano, seus gastos aumentarão para US$ 115 bilhões. Um gasto imenso que levanta o sinal de alerta para a bolha.

O risco do vibe spending

O investimento contínuo na OpenAI, apesar de estar no prejuízo, é impulsionado pelo conceito de ‘vibe spending’: um gasto movido puramente pelo otimismo e pela confiança em um retorno futuro, e não por resultados imediatos. A aposta é que a tecnologia se aprimorará e se tornará tão indispensável que, eventualmente, o lucro virá. Mas até quando o mercado se sustentará nessa “boa vibe”?

Aparentemente, não por muito tempo. A existência da “Bolha da IA” deixou de ser uma teoria para se tornar um fato reconhecido. Jeff Bezos (Amazon), Sam Altman (OpenAI) e Mark Zuckerberg (Meta) já se manifestaram publicamente, confirmando o cenário. Contudo, todos buscaram amenizar o risco, ressaltando as maravilhas que a tecnologia trará e a importância de continuar investindo.

Bezons e Zuckerberg são dois dos executivos a admitir a existência da bolha (Imagem: Chip Somodevilla – Equipe / GettyImages)

Os sinais de alerta

Conforme demonstrou a Bolha PontoCom, o estouro não decreta o fim da tecnologia, mas sim um caos financeiro gigantesco. O Bank of England já alertou sobre a possibilidade de uma “correção repentina” no mercado, o Fundo Monetário Internacional (FMI) recomendou cautela aos investidores, e a Yale Insights chegou a especular sobre o possível mecanismo desse colapso.

Esta é a pergunta de um milhão de dólares. Nenhuma bolha é idêntica à anterior, o que torna extremamente difícil prever o quê, como e quando o estouro ocorrerá. No início do ano, acreditava-se que o lançamento do DeepSeek seria a faísca de ignição, pois uma startup chinesa conseguiu entregar uma tecnologia comparável à de empresas norte-americanas por uma fração do preço. O impacto foi tamanho que as ações da NVIDIA caíram 15%.

Pode ser que a companhia chinesa não seja o “arquiduque Francisco Ferdinando” dessa história, mas o episódio foi suficiente para levantar a suspeita de que a situação seja muito mais delicada e preocupante do que se aparenta. Quando a bolha estourar, ela pode afetar a economia americana de forma tão ruim, ou até pior, do que a “crise do subprime” ou a “bolha imobiliária de 2008”, que mergulharam parte do mundo em recessão.

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