Onda gravitacional incomum pode indicar a existência de buracos negros primordiais

Uma detecção incomum de ondas gravitacionais levantou a hipótese da existência de buracos negros primordiais. O alerta vem do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO) e do Observatório Europeu de Interferometria Laser (Virgo), que registraram uma fusão fora dos padrões conhecidos. 

Um dos objetos parecia leve demais para ser um buraco negro comum. Se confirmado, o evento, designado S251112cm, pode revelar um tipo de corpo cósmico ainda desconhecido.

Em resumo:

  • Detecção incomum de onda gravitacional reacendeu hipóteses sobre buracos negros primordiais;
  • Observatórios registraram fusão anômala envolvendo objeto de massa extremamente reduzida;
  • Especialistas alertam que o sinal pode ser simples ruído;
  • Evento desafia modelos tradicionais sobre formação de objetos extremamente densos;
  • Hipóteses alternativas incluem estrela de nêutrons excepcionalmente leve;
  • Formato da onda pode indicar claramente a natureza envolvida.
Tipos de buracos negros. Crédito: zhafran_10 – Shutterstock/Edição: Gemini

À revista Science, Djuna Croon, teórico de astropartículas da Universidade de Durham, na Inglaterra, que não participou da observação, disse que o sinal não combina com os processos já conhecidos de formação de objetos densos. A novidade, no entanto, exige cautela. Para Christopher Berry, astrônomo de ondas gravitacionais e membro do LIGO na Universidade de Glasgow, na Escócia, também pode ser ruído do detector. “Uma descoberta inovadora ou apenas um alarme falso? Só o tempo (e mais análises) dirá”, publicou Berry no Bluesky, poucas horas após a detecção.

LIGO e Virgo já detectaram mais de 300 ondas gravitacionais

Ondas gravitacionais são pequenas ondulações no espaço geradas quando dois objetos muito densos giram em espiral até se fundirem. Detectá-las exige equipamentos gigantescos e extremamente precisos. O LIGO opera nos EUA com dois interferômetros em forma de L, cada um com braços de quatro quilômetros. Já o Virgo, na Itália, utiliza braços de três quilômetros. Uma onda que passa altera a distância entre esses braços em escalas minúsculas, e essa diferença é identificada pela interferência da luz laser dentro do equipamento.

Desde 2015, os dois observatórios já registraram mais de 300 eventos. A maioria corresponde a fusões de buracos negros, enquanto uma parte menor envolve estrelas de nêutrons. Todos esses objetos tinham massas iguais ou maiores que a do Sol. Estrelas de nêutrons costumam ter entre 1,1 e 2,2 massas solares, e buracos negros de origem estelar podem ter dezenas de massas solares.

Ondas gravitacionais podem trazer pistas do que aconteceu logo após o Big Bang. Crédito: Sakkmesterke – Shutterstock

O novo alerta chamou atenção justamente porque saiu desse padrão. As análises iniciais indicaram que ao menos um dos objetos envolvidos possuía menos de uma massa solar. Isso nunca havia sido observado e não bate com o modelo tradicional de formação de buracos negros, que nasce do colapso de estrelas bem maiores que o Sol. Por isso, alguns cientistas passaram a considerar a possibilidade de buracos negros primordiais.

Esse tipo de objeto teria surgido logo após o Big Bang, quando regiões muito densas do jovem Universo podem ter colapsado devido à própria gravidade. Em teoria, buracos negros primordiais podem ter qualquer massa, desde minúscula até gigantesca. Há décadas, alguns pesquisadores sugerem que eles poderiam explicar parte da matéria escura, o componente invisível que domina a maior parte do cosmos. Observações astronômicas sugerem que, se existirem em grande quantidade, deveriam causar efeitos detectáveis no brilho de estrelas – algo que ainda não foi visto com a frequência necessária.

O índice de confiança do sinal também traz dúvidas. Cada alerta do LIGO e do Virgo inclui uma estimativa chamada taxa de alarmes falsos. Ela indica quantas vezes um ruído poderia imitar um evento real. Neste caso, a probabilidade era de um falso a cada 6,2 anos, depois revisada para um a cada quatro anos. Para fusões comuns, esse valor seria aceitável. Mas, para algo tão raro e potencialmente revolucionário, a incerteza é considerada alta, o que causa desconforto entre pesquisadores.

Buracos negros primordiais ou estrela de nêutrons?

Algumas equipes tentam explicar o evento S251112cm com outras possibilidades, como a fusão envolvendo uma estrela de nêutrons excepcionalmente leve. Mas esse cenário é pouco provável: objetos com massas tão baixas praticamente não aparecem nas observações atuais e contrariam o que os modelos de evolução estelar preveem.

Emanuele Berti, da Universidade Johns Hopkins, nos EUA, comenta que existem modelos capazes de gerar estrelas de nêutrons menores, mas são cenários altamente especulativos. Uma hipótese imagina que uma estrela gigantesca poderia colapsar formando um anel de matéria que produziria pequenas “miniestrelas”. Mesmo assim, essa explicação é quase tão improvável quanto a dos buracos negros primordiais.

Representação artística dos buracos negros primordiais. Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA

Os cientistas também descartam que o sinal venha de anãs brancas, que são restos de estrelas comuns. Esses remanescentes têm milhares de quilômetros de diâmetro, e, ao girarem próximos, se tocariam muito antes de alcançarem a frequência necessária para gerar ondas detectáveis pelos interferômetros.

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O LIGO e o Virgo emitiram o alerta rapidamente para que outros observatórios tentassem registrar qualquer brilho associado ao evento. Uma explosão de luz indicaria que havia matéria envolvida, o que favoreceria a hipótese de estrelas de nêutrons. Mas a área do céu indicada pelos detectores era enorme (cerca de 6.000 vezes o tamanho da Lua cheia), o que torna quase impossível localizar qualquer fonte luminosa.

Mesmo sem essas pistas, ainda existe a chance de desvendar a natureza do fenômeno apenas analisando o formato da onda gravitacional. Alexander Nitz, especialista em ondas gravitacionais da Universidade de Syracuse, EUA, e ex-membro do LIGO, explica que fusões de objetos leves produzem um zumbido contínuo que pode durar minutos ou horas.

Estrelas de nêutrons deixam marcas específicas nesse zumbido devido às forças de maré entre elas. Buracos negros, por sua vez, não produzem esse tipo de sinal. Dessa forma, comparar esses padrões pode revelar que tipo de objeto estava envolvido.

A confirmação definitiva só virá com a detecção de eventos semelhantes. “O primeiro indício sempre traz ceticismo”, afirma Berti. “Mas quando padrões se repetem, a confiança cresce muito.” Croon lembra, no entanto, que talvez jamais seja possível saber com certeza se esse alerta foi real ou apenas um ruído excepcionalmente convincente. Para ela, o caso pode permanecer como mais um mistério na busca por entender os primeiros instantes do Universo.

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