Parasita macabro “obriga” hospedeiro a se afogar; entenda

O ditado já dizia que você é o que você come, mas e quando o que a gente come toma conta do corpo e parece se transformar em nós mesmos?

Em muitos quintais e brejos, insetos perfeitamente saudáveis passam a agir de modo estranho, como se uma vontade alheia tivesse ocupado seus circuitos mais básicos. Eles abandonam a rotina, buscam água com urgência e seguem em frente mesmo quando isso coloca a própria sobrevivência em risco.

À primeira vista soa como lenda, mas é um roteiro real do mundo dos parasitas, em que um fio quase invisível encontra no interior do hospedeiro abrigo e tempo para crescer até que algo muda no comportamento e a história dá uma guinada. A pergunta que fica é simples e inquietante. Quem está no controle?

Conheça o verme crina-de-cavalo: o parasita que obriga o hospedeiro a se afogar

Chamado popularmente de verme crina-de-cavalo, este parasita pertence ao filo Nematomorpha e é conhecido em muitas regiões como verme górdio, alusão aos nós emaranhados que forma quando vários indivíduos se enovelam. O nome crina-de-cavalo surgiu porque os adultos lembram fios de cabelo longos e finos, com poucos milímetros de espessura e muitos centímetros de comprimento.

Microscopias mostram um “verme crina-de-cavalo” recém descrito, o Gordius terrestris, visto em close. Nas três primeiras imagens a ponta da cauda, por baixo, muda de formato. Na imagem maior aparece uma fileira de cerdas muito finas que corre pela borda interna da cauda e um círculo de cerdas na extremidade. As três imagens inferiores revelam diferenças na textura da “pele”, com pequenos relevos em forma de polígonos e cerdas ramificadas. As barras brancas indicam o tamanho real, de 175 micrômetros a 8 micrômetros. Crédito: Anaya, Schmidt-Rhaesa, Hanelt e Bolek, ZooKeys 2019, Pensoft, CC BY 4.0.

Em lagos, bebedouros, fontes, poças e córregos de águas lentas, esses fios vivos passam despercebidos para quem não conhece o grupo, mas revelam uma das histórias mais curiosas do mundo dos parasitas.

Embora o apelido remeta a cavalos, eles não parasitam equinos nem humanos. A fama se deve ao aspecto e à cena frequente de aparecerem como cordões escuros em recipientes de água usados por animais nas áreas rurais.

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A vida adulta do verme crina-de-cavalo acontece na água. É lá que os indivíduos se encontram, copulam e liberam massas de ovos em cordões gelatinosos que se fixam em plantas aquáticas, pedras e outros substratos.

Dessas massas eclodem larvas minúsculas, invisíveis a olho nu para a maioria das pessoas, que precisam encontrar um caminho até um hospedeiro terrestre ou semiterrestre para continuar o ciclo. É um plano que combina paciência e oportunidade.

Verme crina de cavalo Paragordius tricuspidatus fotografado fora do hospedeiro, mostrando o corpo extremamente fino e comprido, com um exemplar esticado e outro enovelado. Crédito: D. Andreas Schmidt Rhaesa, via Wikimedia Commons, CC BY SA 3.0.

As larvas ficam disponíveis no ambiente, aderem a alimentos úmidos ou são engolidas quando o futuro hospedeiro bebe água em poças e bebedouros. Em muitos lugares, o auge da atividade reprodutiva coincide com períodos quentes e chuvosos, quando a água parada e as bordas úmidas dos corpos d’água concentram insetos e aumentam as chances de encontro.

Uma vez dentro do hospedeiro, a larva atravessa tecidos até o interior do corpo, onde encontra espaço e recursos para crescer. Ali o verme se alimenta e se alonga por semanas ou meses, ocupando a cavidade corporal como um fio elástico que se dobra sobre si mesmo. O crescimento não precisa matar o hospedeiro. O objetivo é completar o ciclo e atingir a fase adulta de volta à água.

Quando atinge o tamanho e o estágio adequados, o parasita muda o comportamento do hospedeiro. O inseto passa a procurar um ambiente aquático mesmo que isso contrarie seu padrão natural. Diante de um lago, um tanque, uma poça ou um balde, o hospedeiro entra na água e permanece ali tempo suficiente para que o verme deixe o corpo e nade livre.

Muitas vezes o inseto se afoga durante o processo, o que deu fama ao parasita que obriga o hospedeiro a se afogar para viabilizar o retorno do verme ao ambiente aquático.

Quais bichos ele parasita e por que parecem zumbis

Louva-a-deus preservado com um verme crina-de-cavalo emergindo do abdome e formando espirais, registro clássico do momento em que o parasita abandona o hospedeiro. Crédito: Frost Entomological Museum, Pennsylvania State University, via Flickr, 10 de março de 2016.

Os alvos mais comuns são insetos de médio porte que transitam entre ambientes úmidos e secos, como grilos, gafanhotos, esperanças, baratas e louva-a-deus. Esses animais bebem água em poças e lambeiros, consomem matéria vegetal úmida e frequentam regiões onde as larvas do verme podem estar aderidas.

Uma vez infectados, seguem a vida até que o parasita complete o crescimento. É no final do ciclo que o comportamento muda de modo mais dramático, e o hospedeiro passa a agir como se estivesse programado para mergulhar. Daí vem a imagem de zumbi.

Não há perda total de controle, mas há um comando interno que empurra o inseto para o cenário ideal do parasita. Para quem observa de fora, a cena é marcante. Um grilo entra no bebedouro de um animal e, minutos depois, um fio escuro sai de seu corpo e serpenteia na água.

Por que o verme não oferece risco a pessoas?

Apesar do impacto visual e do ciclo tão eficiente, o verme crina-de-cavalo não é considerado uma ameaça para humanos, cães, gatos e animais de grande porte. O parasita evoluiu para explorar hospedeiros muito específicos, geralmente insetos de vida terrestre com forte ligação com ambientes úmidos.

Em pessoas e mamíferos, o encontro com o verme adulto é mais frequente em recipientes de água, tanques e fontes. Encontrar um indivíduo em um balde ou no bebedouro de um animal não significa contaminação do rebanho nem risco de infecção interna.

O mais adequado é descartar a água, enxaguar o recipiente e repô-lo com água limpa. Em ambientes naturais, o verme compõe a cadeia de interações que ajuda a regular populações de insetos e serve de alimento para outros organismos aquáticos.

Com informações de Missouri Department of Conservation.

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