Um tesouro de 225 estatuetas funerárias veio à tona numa tumba real na antiga capital egípcia de Tanis, no Delta do Nilo. As pequenas figuras, conhecidas como ushabti, estavam intactas e no lugar original (um achado raríssimo, diga-se). E finalmente resolveram um mistério que intrigava arqueólogos há décadas.
Essa coleção permitiu identificar o dono de um sarcófago anônimo: o faraó Shoshenq III, que governou entre 830 e 791 antes de Cristo. A revelação, no entanto, abriu outro enigma. Por que o rei não foi enterrado no túmulo que havia preparado para si? O descompasso sugere falhas na sucessão ou no sepultamento planejado durante seu turbulento reinado.
Descoberta de estatuetas desvenda identidade de faraó em Tanis
A equipe francesa liderada pelo egiptólogo Frederic Payraudeau encontrou o conjunto de estatuetas durante escavações na necrópole real de Tanis. As figuras eram colocadas nos túmulos como pequenos “servos” que acompanhariam o morto na vida após a morte. E não era um grupo comum: mais da metade representava mulheres, algo que Payraudeau classificou como “bastante excepcional”, segundo a AFP.

O achado impressionou também pela preservação. “Encontrar estatuetas no local dentro de uma tumba real não acontece na necrópole de Tanis desde 1946”, segundo o pesquisador.
Por que? A maior parte dos sítios funerários egípcios – especialmente o Vale dos Reis, perto de Luxor – foi saqueada várias vezes ao longo da história. Exceções verdadeiramente intactas, como a do famoso rei menino Tutankhamun em 1922, são extremamente raras.
Entre as pequenas figuras, um detalhe selou a identificação do túmulo: o símbolo real gravado nos ushabti. Foi ele que revelou que o sarcófago anônimo pertencia a Shoshenq III. O Ministério do Turismo e Antiguidades do Egito descreveu a descoberta como “um passo decisivo na solução de um mistério arqueológico de longa data”.
Processo de escavação revela organização incomum e levanta novo enigma
A cena começou a se desenrolar na manhã de 9 de outubro, quando a equipe já havia limpado três cantos de um túmulo estreito dominado por um grande sarcófago sem nome. Bastou ver as primeiras peças para perceber a dimensão da descoberta. “Quando vimos três ou quatro estatuetas juntas, soubemos imediatamente que seria incrível”, disse Payraudeau.
A partir daí, o trabalho ganhou ritmo de operação. Para lidar com a densidade e a delicadeza das peças, a missão instalou iluminação e passou a trabalhar durante a noite. A remoção das 225 estatuetas verdes levou dez dias. E revelou um arranjo incomum: figuras “cuidadosamente arranjadas em forma de estrela ao redor das laterais de um fosso trapezoidal e em fileiras horizontais no fundo”, segundo o egiptólogo.
Mas a descoberta trouxe uma surpresa desconcertante. A tumba que carrega o nome de Shoshenq III (e abriga o maior sarcófago do local) não é aquela onde o corpo dele foi encontrado. “Por que ele não está enterrado neste túmulo?”, questiona Payraudeau.

Para um faraó, construir um túmulo sempre foi uma “aposta”. Isso porque ele “nunca pode ter certeza de que seu sucessor o enterrará lá”. E, segundo o pesquisador, “claramente, temos novas provas de que essas apostas nem sempre são bem-sucedidas”.
O reinado de quatro décadas de Shoshenq III foi marcado por uma guerra civil sangrenta entre o Alto e o Baixo Egito, com disputa de poder entre faraós. É possível que a sucessão não tenha seguido o plano original e que o sepultamento tenha sido desviado.
Outra hipótese é a movimentação posterior das múmias para protegê-las de saques. No entanto, é “difícil imaginar que um sarcófago de granito de três metros e meio por um metro e meio pudesse ter sido reinstalado num lugar tão pequeno”, pondera o egiptólogo.
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Tanis, fundada por volta de 1050 a.C. como capital da 21ª dinastia, tornou-se necrópole real após o Vale dos Reis sofrer saques sucessivos, inclusive sob reinados como o de Ramsés.
Agora, ao analisar a câmara estreita onde o conjunto foi encontrado, Mohamed Abdel-Badii, chefe do Setor Arqueológico Egípcio, afirma que a missão revelou “padrões anteriormente desconhecidos dentro da própria câmara, lançando luz sobre os métodos de sepultamento durante esse período”. Concluído o estudo, as estatuetas seguirão para exibição num museu egípcio.
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