Um grupo internacional de cientistas descobriu um tipo de vidro cósmico. Formado por impacto de asteroide, ele só foi encontrado na Austrália. As pequenas esferas, batizadas de ananguites, se formaram há cerca de 11 milhões de anos. E revelam uma colisão até então desconhecida na história da Terra.
O achado, liderado por pesquisadores das universidades Curtin (Austrália) e Aix-Marseille (França), indica que o impacto foi poderoso o bastante para lançar fragmentos a milhares de quilômetros. Mas a cratera de origem ainda não foi encontrada.
O estudo foi publicado na edição de novembro da revista Earth and Planetary Science Letters. E ajuda a reescrever parte da história geológica da Terra.
Pesquisa descobre na Austrália tipo de vidro vindo do espaço
Os ananguites pertencem a uma categoria rara de materiais chamados tektites, ou “vidros de impacto”. Eles se formam quando um asteroide atinge a superfície da Terra com tamanha força que parte do solo derrete instantaneamente e é lançada a grandes altitudes.
Ao esfriar durante a queda, esse material se transforma em pequenas esferas de vidro natural. É uma espécie de assinatura mineral de um impacto cósmico. Cada tektite guarda pistas químicas e isotópicas sobre o local e as condições nas quais o evento ocorreu.
Até agora, a ciência conhecia apenas cinco campos de tektites espalhados pelo mundo: na Europa, América do Norte, Costa do Marfim, América Central e na vasta área australásica, que cobre parte da Ásia e da Austrália.
A descoberta das ananguites marca o sexto campo global e o único totalmente australiano. Com composição andesítica e traços químicos incomuns, essas minúsculas esferas de vidro cósmico são um registro direto de um impacto gigante ocorrido há cerca de 11 milhões de anos, até então desconhecido.
Amostras antigas têm pistas antigas de impacto sem cratera visível
A descoberta começou com uma reanálise de amostras coletadas há mais de meio século. Em 1969, cientistas da NASA já haviam identificado alguns fragmentos de vidro no deserto australiano que não se encaixavam no padrão dos demais tektites da região.
Esses oito exemplares ficaram conhecidos por terem uma composição química anômala, com menos sílica e mais ferro, cálcio e magnésio. Por décadas, o mistério permaneceu sem solução — até que uma nova equipe, liderada pela geocientista Anna Musolino, da Aix-Marseille University, decidiu revisitar o caso.
Ao examinar milhares de amostras no Museu da Austrália do Sul, o grupo encontrou seis novos fragmentos com a mesma assinatura química. Com técnicas modernas de datação por isótopos de argônio, eles calcularam a idade das amostras em 10,76 milhões de anos. Isso confirmou um impacto completamente independente do famoso campo australásico, de 780 mil anos.
O mais intrigante é que a cratera do impacto ainda não foi localizada. Os dados geoquímicos indicam que o evento pode ter ocorrido numa zona de arco vulcânico no Pacífico, em regiões como Luzon (Filipinas), Sulawesi (Indonésia) ou Papua-Nova Guiné.
O impacto teria lançado material fundido a milhares de quilômetros, cobrindo o centro-sul da Austrália com um campo de dispersão de cerca de 900 quilômetros de extensão.
Segundo os autores, é possível que a cratera tenha sido apagada por erosão e desertificação ao longo de milhões de anos. Ou mesmo confundida com formações vulcânicas.
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Por que essa descoberta importa
A identificação das ananguites amplia o número de grandes impactos conhecidos na história geológica recente e ajuda os cientistas a refinar estimativas sobre a frequência e a intensidade dessas colisões.
Cada novo campo de tektites oferece um retrato único de como asteroides moldaram a superfície do planeta ao longo do tempo. Para o geocronólogo Fred Jourdan, da Curtin University, esses pequenos fragmentos “são como cápsulas do tempo microscópicas que guardam registros da história profunda da Terra”.
Ele explica que compreender o passado dos impactos é essencial para entender não apenas a evolução do planeta, mas também avaliar riscos de futuras colisões e aprimorar estratégias de defesa planetária.
O estudo também reforça que grandes impactos podem ser mais comuns do que se imaginava, mesmo que muitos tenham deixado poucos vestígios visíveis.
Ao mostrar que um evento dessa magnitude passou despercebido por milhões de anos, a descoberta das ananguites revela o quanto ainda há a ser aprendido sobre a relação entre a Terra e os objetos que cruzam sua órbita.
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